Quando crianca eu passava horas olhando para o céu. Talvez porque eu morasse no interior e ainda não houvesse tantas distrações como hoje. Talvez porque faltasse luz e ficássemos as escuras naquelas noites claras de calor sufocante. Não importa. Eu me divertia imaginando viagens e aventuras fantásticas na lua, nas estrelas ou no espaço. Não havia limites para a minha imaginação.
Também gostava de contar estrelas. É claro que sempre me perdia, pois contar estrelas é uma tarefa hercúlea. Tinha que ter olhos de super-homem - o que não era meu caso, míope de dar dó. E entre as estrelas que eu contava sempre surgia uma nova que me fazia perder a conta. Estava eu com o dedinho apontado para cima, olhos apertados quando - pimba!, pipocava outra estrela, o que me deixava perplexo e frustrado.
Até que um dia alguém me disse que o céu era o lugar onde iríamos morar depois que deixássemos a terra. Uau, pensei, que legal. Minhas brincadeiras e aventuras seriam acompanhadas da turma toda de amigos da rua! Reencontraria meu avô! Estava assim explicado o surgimento das novas estrelas enquanto eu contava. As brincadeiras de esconde-esconde. O brilho de intensidade desigual, como se estivessem a conversar na noites singelas iluminadas por tanta magia.
Muitos anos depois, entre prédios iluminados e mil compromissos, parei um minuto e distraído saí para olhar o céu. Interessante, pensei, tanta coisa mudou no mundo mas o céu permanecia igualzinho com sua infinidade de estrelas e mistérios. Um sentimento de alegria quase infantil surgiu do nada. Mas a minha mente logo se desviou para alguma das minhas tarefas inadiáveis. Tinha que trabalhar. Virei-me para retornar quando uma maozinha puxou a minha calça e perguntou: "pai, é verdade que quando morrermos iremos para o céu e nos tornaremos estrelas?".
Olhei para baixo e vi aquele rostinho sorridente e não tive resposta. Eu a peguei no colo e ficamos em silêncio admirando aquele espetáculo grandioso. Aos poucos comecei a me lembrar das brincadeiras, das aventuras. Das histórias. Então olhei para ela e disse: "a verdade, filhinha, é que um dia estaremos todos juntos lá em cima brincando e nos divertindo muito. Olhe aquelas estrelinhas ali, não estão se mexendo? Elas nunca param de brincar. Veja como elas conversam. Falam a noite toda, acredite". Rimos juntos.
Ficamos na varanda do apartamento. O barulho do tráfego cada vez mais distante. A brisa fresca da noite nos enlaçando suavemente em sua magia. Abracei forte aquela criança agora tão curiosa como eu havia sido um dia, e ficamos de olhos fixos a explorar a imensidão do céu. Algum tempo depois voltei para o meu trabalho e ela ficou lá, concentrada em contar estrelas, imagino. Observei-a de longe. Sonhava? Certamente que sim. Fiquei feliz. O mundo necessita muito dos sonhadores. Por eles as novas estrelas brilham mais.
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