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quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Rio de Janeiro, UK

Poucos dias depois de chegar a Londres, estava eu saindo do metrô numa manhã fria quando notei que estava perdido. Fiquei parado em frente da estação quando uma senhora se aproximou e perguntou se eu estava precisando de ajuda. Fiquei desconfiado. Não tinha cara de assaltante nem de 171. Pegou o mapa do metrô - sim, eu tinha um - e gentilmente me deu as coordenadas. Fui em frente olhando discretamente para ver se não estava sendo seguido.

Outro dia cinzento estava eu atravessando a rua quando um carro vira repentinamente a esquina e me dá um belo susto. Usei meu repertório para xingar todas as gerações do apressadinho quando o carro para, o motorista desce esbaforido e pede desculpas sem parar. Fiquei meio que frustrado. O cara não queria briga? Nem um empurrãozinho?


Cansei de pisar nos pés de pessoas em ônibus e ELAS pedirem desculpas. Pessoas abriam e seguravam portas para eu entrar. O tempo todo você ouve por favor, obrigado e com licença. Ninguém fura fila, fala alto ou invade o seu espaço. Tudo organizado. Tudo funcionando. Tudo muito estranho.

Um ano depois voltei para o Rio. Cheguei no início da tarde num dia de muito calor. Peguei um táxi e o motorista, malandro, deu logo um monte de voltas para eu "conhecer" a cidade, mas eu o fiz parar num ponto de ônibus. Ao descer, paguei e falei: - perdeu a gorjeta, mané.
Um a zero para mim.

Mas só voltei a sentir o famoso calor humano do carioca quando tentei entrar no ônibus. Digo tentei porque para entrar todos se empurravam, derrubavam e passavam por cima - como não poderia deixar de ser. Quem não conseguia entrar ia agarrado na porta traseira mesmo. Quando finalmente entrei viajei em pé, enquanto o motorista dirigia em alta velocidade. E entre freadas e retomadas bruscas passageiros desciam do veículo e iam aos tropeços para a calçada. Quando caíam, todos riam muito felizes. Inclusive o caído.

A  viagem de ônibus dava uma sensação boa de estar vivo. Frequentemente tinha que me segurar firme para evitar que os outros passageiros me levassem junto quando desciam. O calor não era problema tampouco. Esperto, fiquei perto de uma janela aberta por onde entrava aquele mormaço inigualável. Resultado: sauna de graça. Quando o engarrrafamento começou eu já estava readaptado. Na boa.

Mas estava faltando alguma coisa para eu me sentir realmente em casa. E aconteceu. Como o ônibus quebrou, resolvi fazer uma longa caminhada para casa. E lá fui eu feliz da vida, já noitinha, quando dois sujeitos me cercaram. Pensei: perdi. Mas olha que curioso, um deles pediu que eu passasse a carteira, "por favor", e até me agradeceu depois que saiu andando.

Rapaz, não gostei. Taí uma coisa que eu não esperava. Segui o resto do caminho pensando se tudo estava nos conformes mesmo. Cheguei a conclusão que estava sim, mas o ladrão educado destoou. Fiquei arrepiado ao pensar que poderíamos um dia ficar igual aquela triste cidade cinza. "Por favor"? Ora, vai assaltar em Londres, malandragem! E segui resoluto para o meu apê me desviando das tampas de bueiro.

Sobre o Autor:
Marcos Mendes Marcos Mendes é músico e compositor. É também observador inquieto que escreve o que vê e o que sente em relação a vida e o mundo. Fala sobre assuntos sérios sem perder o tom da descontração.

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